«Cristo Pantocrátor Mosaico Aghia Sophia - Constantinopla»
Para os católicos, este Domingo é o último do ano da Igreja. No próximo 2 de dezembro estaremos entrando no Ano Litúrgico de 2013, com o Primeiro Domingo do Advento, preparando os cristãos para o santo Natal.
Este último Domingo é chamado Domingo de Cristo Rei, pois celebra-se a
Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo. É um título
problemático, esse dado a Jesus... Ele é Rei mesmo? Rei do quê? Rei num mundo
que o rejeita, Rei de um Ocidente que cada vez mais lhe volta as costas? Não
seria mais lógico, mais realista afirmar que os reis de hoje são os Neymares, o
Joaquim Barbosa, o Barack Obama e os heróis de plantão? Será que
celebrar o Senhor Jesus com este título portentoso, “Rei do Universo”, não é
mais uma prova de que os cristãos estão delirando, apegados a um passado
glorioso, quando a sociedade era cristã e a Igreja tinha poder?
Quando os cristãos confessamos que Cristo é Rei, de que reinado estamos
falando? A que Reino estamos nos referindo? Nós realmente acreditamos com todo
o coração e confessamos com toda convicção que Jesus Cristo – e só ele! – é
Rei: Rei do universo, Rei da história, Rei da humanidade, Rei da vida de cada
pessoa humana, cristã ou não-cristã. Ele é Rei porque é Deus feito homem, é,
como diz a Escritura, aquele “através de quem e para quem todas as coisas foram
criadas, no céu e na terra... Tudo foi criado através dele e para ele... Ele é
o Primogênito dentre os mortos” (Cl 1,1518).
No entanto, é necessário compreender a natureza do reinado de Jesus. A
Liturgia de Cristo Rei coloca-nos uma frase do Apocalipse que é surpreendente:
“O Cordeiro que foi imolado é digno de receber o poder, a divindade, a
sabedoria, a força e a honra. A ele a glória e poder através dos séculos!”
Frase surpreendente, sim! Quem é Aquele que proclamamos Rei? O Cordeiro; e
Cordeiro imolado. Cordeiro evoca mansidão, paz, fragilidade... Nosso Rei não é
aquele que faz e acontece, aquele que passa por cima feito trator... Nosso Rei
é o Cordeiro que foi esmagado na cruz, Aquele que foi imolado pelo Pecado do
mundo. O mundo passou e passa por cima do nosso Rei, refuta seu Evangelho,
desdenha de sua Palavra, ridiculariza seus preceitos.. Esse Rei é Aquele que
foi crucificado, que foi derrotado e terminou sozinho. No Evangelho da Missa do
próximo Domingo escutaremos que zombaram e zombam dele: “A outros ele salvou.
Salve-se a si mesmo, se de fato é o Cristo de Deus, o Escolhido! Tu não és o
Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!” (Lc 23,35.39)
Não! Decididamente, Jesus não é Rei nos moldes dos reis da terra. Não
podemos imaginar os reis, presidentes e manda-chuvas deste mundo, para depois
enquadrar Cristo nesses modelos. O reinado de Cristo somente pode ser
compreendido a partir da lógica do próprio Cristo: “O Filho do Homem não veio
para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc
10,45). Eis o modo que Cristo tem de reinar: servindo, dando vida e entregando
a própria vida. Tão diferente dos reis da terra, dos políticos e líderes de
ontem de hoje: “Sabeis que aqueles que vemos governar as nações as dominam, e
os seus grandes as tiranizam. Entre vos não será assim...” (Mc 10,42s). Cristo é
Rei porque se fez solidário conosco ao fazer-se um de nós, é Rei porque tomou
nossa vida sobre seus ombros, é Rei porque passou entre nós servindo, até o
maior serviço: entregar-se totalmente na cruz. É rei porque, agora, no céu,
Deus e homem verdadeiro, é Cabeça e Princípio de uma nova criação, de uma nova
humanidade, de uma nova história, que se consumará na plenitude final. A festa
de Cristo Rei liga-se a uma outra: a do Domingo de Ramos, quando, com ramos nas
mãos, cantamos o reinado de Cristo, que entrava em Jerusalém num burrico –
animal de carga de serviço – para ser coroado de espinhos, morrer e
ressuscitar.
Tudo isto nos coloca em crise, pois este Rei-Messias olha para nós,
cristãos, seus discípulos, e nos convida a segui-lo por esse caminho: não o da
glória, mas da humildade; não o do sucesso a qualquer custo, mas da fidelidade
a todo preço; não o das honras, mas do serviço; não o da imposição, mas da
proposta humilde. Quantas vezes os cristãos pensaram o reinado de Cristo de
modo demasiado humano, quantas vezes a Igreja pensou que o Reino do Senhor
estava mais presente quando ela era honrada, reverenciada, presente nos
corredores dos palácios ou nos palanques dos grandes do mundo... Ilusão;
tentação diabólica! Nosso verdadeiro reinado, nossa real serviço, nossa
inalienável dignidade é unir-se a Cristo no seu caminho de humilde serviço ao
Evangelho, seguindo os passos do nosso Senhor: “Fiel é esta palavra: Se com ele
morremos, com ele viveremos. Se com ele sofremos, com ele reinaremos” (2Tm
2,11). Todas as vezes que esquecemos isso, fomos infiéis e indignos de reinar
com Cristo. Houve tempos gloriosos na nossa história de Igreja de Cristo: já
fomos perseguidos pelos romanos, já fomos perseguidos em tantos lugares da
terra: já nos mataram, torturaram, pisaram, discriminaram... Houve tempos
tristes: quando perseguimos, torturamos e discriminamos... pensando, assim,
manifestar o Reino de Cristo! Que engano! Que ilusão!
Hoje, temos uma nova chance. Nos países muçulmanos e budistas, somos
cidadãos de segunda classe, perseguidos e mortos (ninguém divulga isso!), na
China, somos colocados na prisão e nossos Bispos são condenados a trabalhos
forçados e, aqui, no nosso Brasil, somos chamados de reacionários, medievais,
obscurantistas, anacrônicos, contrários à ciência e ao progresso... porque não
aceitamos o aborto, a eutanásia, o assassinato de deficientes, a dissolução da
família... É, mais uma vez, a chance de testemunhar o reinado de Cristo, de
permanecermos firmes no combate, com a humildade que é capaz de dialogar e
ouvir, mas também com a firmeza que não arreda o pé da fidelidade ao Senhor:
“Vós sois os que permanecestes constantemente comigo em minhas tribulações;
também eu disponho para vós o Reino, como meu Pai o dispôs para mim, a fim de
que comais e bebais à minha mesa em meu Reino” (Lc 22,28-30). Que missão, que
chance, que desafio, que graça! Com serenidade e firmeza, na palavra, na vida e
na morte, testemunhemos: Jesus Cristo é Rei e Senhor, Princípio e Fim de todas
as coisas. Só a ele a glória!
Adaptação do texto originalmente escrito
por Dom Henrique Soares da Costa,
Bispo Auxiliar de Aracaju
www.domhenrique.com.br
por Dom Henrique Soares da Costa,
Bispo Auxiliar de Aracaju
www.domhenrique.com.br
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