Extraído do Livro "Vida, Paixão e Glorificação do Cordeiro de Deus
Anna Catharina Emmerich(*) - Ed. MIR.
Jesus
aparece aos dois discípulos no caminho de Emaús
Na segunda-feira depois da Páscoa, os dois discípulos Lucas e Cléofas, que era neto do tio de Maria Cleofé, se dirigiram a Emaús. Saíram de Jerusalém por caminhos diferentes e encontraram-se novamente fora da cidade. Ambos duvidavam ainda da ressurreição de Jesus e queriam falar mais a miúdo sobre tudo quanto ouviram. O tratamento ignominioso e a crucificação do Mestre lhes eram particularmente uma pedra de escândalo. Pelo meio do caminho se aproximou o Senhor, vindo de um atalho. Por algum tempo os seguiu, depois se lhe juntou e perguntou-lhes de que estava falando.
“Mas os olhos de
ambos estavam como que vendados e não o conheceram”, conta S. Lucas no
cap. 24 do seu Evangelho e o Mestre disse lhes: “De que estais falando
pelo caminho, e porque estais tristes?” E respondendo um deles, chamando
Cléofas, disse-Lhe: “És talvez o único forasteiro em Jerusalém, que não
sabes o que se tem passado ali nestes últimos dias?” Disse-lhes Jesus:
“O que foi?” E responderam os dois: “O que aconteceu a Jesus
Nazareno, que foi um varão profeta, poderoso em obras e em palavras diante de
Deus e todo o povo; e como os sumos sacerdotes e os nossos magistrados o fizeram
condenar à morte e o crucificaram. Ora, nós esperávamos que Ele fosse aquele que
devia salvar Israel e agora, além de tudo, já é hoje o terceiro dia depois que
sucederam estas coisas. É verdade que certas mulheres que conosco estavam, nos
espantaram, pois na alvorada foram ao sepulcro e, não Lhe tendo achado o corpo,
voltaram dizendo que também tinham tido uma visão de Anjos, os quais disseram
que Ele está vivo. E alguns dos nossos foram ao sepulcro e acharam que era assim
como tinham dito as mulheres, mas a Ele não O acharam”. Então lhes disse
Jesus: “Ó gente sem inteligência! Porventura não era preciso que o Cristo
sofresse estas coisas e que assim entrasse na sua glória?” E começando por
Moisés e discorrendo por todos os outros profetas, explicou-lhes o que d'Ele
estava dito em toda a Escritura”.
Chegando perto de Emaús,
o Senhor quis separar-se dos dois discípulos. “Eles, porém, conta a piedosa
Emmerich, obrigaram-nO a entrar numa casa, que estava situada na segunda fileira
das casas de Emaús. Não havia mulheres na casa, que me parecia ser uma casa
aberta para celebração de festas; pois se via que fora nela celebrada uma festa;
ainda havia restos de ornamentação. O aposento era quadrangular e limpo, a mesa
estava posta e os assentos dispostos do mesmo modo que no banquete do dia de
Páscoa. Um homem trouxe um favo de mel num vaso trançado, semelhante a um
cestinho, um bolo grande quadrado e um pequeno pão ázimo, delgado e
transparente, que foi colocado diante do Senhor, como hóspede. O homem que
trouxe o bolo, parecia bem intencionado; vestia algo de semelhante a um avental
e parecia ser cozinheiro ou despenseiro. Tinha cabelos pretos. Durante o ato
solene não estava presente. O bolo tinha a grossura de papelão e era marcado com
linhas sulcadas, que o dividiam em partes da largura de dois dedos.
Depois de terem rezado,
Jesus, recostado nos assentos, comeu primeiro com eles do bolo e do mel. Depois
tomou o pãozinho estriado, cortou-o com uma curta faca branca de osso e
tirou-lhe três partes ainda unidas. Este pedaço colocou sobre um pequeno
prato, benzeu-o e levantando-se, elevou-o com ambas as mãos e rezou, olhando
para o céu. Os dois discípulos estavam em frente, muito comovidos e como
fora de si. Quando Jesus partiu o bocado, aproximaram a boca por cima da mesa e
receberam da mão do Senhor o pedaço. Vi, porém, que ao levar com a mão o
terceiro bocado à boca, o Senhor desapareceu. Não posso afirmar que comesse
realmente o bocado. Os bocados resplandeciam,
depois de Jesus os ter benzido. Vi os dois discípulos
ficarem ainda algum tempo como que atordoados e depois se abraçarem um ao outro,
chorando”.
Jesus
aparece aos Apóstolos na sala do Cenáculo
Os dois discípulos voltaram
imediatamente a Jerusalém. No entretanto achavam-se os Apóstolos, com exceção de
Tomé, na sala do Cenáculo, junto com muitos discípulos, entre os quais também
Nicodemos e José de Arimatéia. As portas da casa e da sala estavam bem fechadas.
Três vezes se reuniram para a oração, formando sob o candeeiro um círculo,
aberto para o lado do Santíssimo. Todos vestiam longas vestes brancas e cintos;
três dos Apóstolos, porém, estavam com vestimentas mais vistosas e entre estes
três, era Pedro o primeiro. Num vestíbulo que dava para a sala, assistiram à
oração a Santíssima Virgem, Maria Cleofé e Madalena.
Apesar de Jesus já ter
aparecido a vários Apóstolos, não havia ainda uma fé firme na sua ressurreição.
Chegaram então os dois discípulos, anunciando com muita alegria que tinham visto
o Senhor e que o reconheceram ao partir o pão.
“Tendo-se reunido de novo
para a oração, conta Anna Catharina, vi-lhes os rostos tornarem-se luminosos,
pensativos e felizes e vi o Senhor aparecer na porta, que estava fechada. Vestia
também uma longa veste branca, com uma simples cinta. Pareciam ter um sentimento
indefinido de sua presença, até que, passando pelo meio deles, parou sob o
candeeiro; ao vê-Lo, ficaram todos espantados e comovidos. O Senhor mostrou-lhes
os pés e as mãos e abrindo a túnica, mostrou-lhes a chaga do lado. Falou-lhe e,
como estavam muito assustados, pediu alguma coisa para comer. Vi que da boca se
lhe derramava luz sobre os Apóstolos, que estavam como encantados.
Então foi Pedro atrás de
um biombo ou tapete, a uma parte separada da sala, onde era guardado o SS.
Sacramento, sobre o forno pascal; havia ali também um aposento lateral, onde
guardavam a mesa baixa (tinha cerca de um pé de altura), depois de terminada a
refeição. Sobre essa mesa se encontrava um prato fundo, oval, coberto com uma
toalha branca, o qual Pedro trouxe ao Senhor. Havia nele um pedaço de peixe e um
pouco de mel; Jesus agradeceu, benzeu a comida e comeu; deu também alguns
bocados aos outros, mas não a todos. Ofereceu também à Virgem Santíssima e às
outras mulheres, que estavam no vestíbulo.
Depois o vi ainda ensinar
e distribuir os poderes. Os discípulos formavam-lhe em roda um tríplice círculo,
no meio da qual ficaram os dez Apóstolos: Tomé não estava presente. Pareceu-me
maravilhoso que parte das palavras e instruções do Mestre só os Apóstolos
percebessem, digo percebessem, pois não O vi mover os lábios. Estava
resplandecente, irradiava-se-Lhe luz das mãos, dos pés, do lado e da cabeça,
sobre os Apóstolos, como se soprasse sobre eles e essa luz os penetrava;
perceberam que podiam perdoar os pecados, que deviam batizar e curar os
enfermos, impor as mãos e que podiam beber veneno, sem que lhes fizesse mal.
Jesus explicou-lhes
vários trechos da Escritura Sagrada, que se Lhe referem e ao Santíssimo
Sacramento e mandou fazer uma adoração ao Santíssimo Sacramento, depois
do culto do sábado. Falou também dos ossos e das relíquias dos antepassados e do
respectivo culto, para lhes alcançar a intercessão. Também Abraão tinha em poder
os ossos de Adão e colocava-os no altar, quando oferecia sacrifícios. Além
disso, falou Jesus também do mistério da Arca da Aliança e que esse mistério
seria, daí em diante, o seu Corpo e
Sangue, que lhes tinha dado para sempre, esse Sacramento.
Discorreu também sobre a Sagrada Paixão e ainda algumas coisas maravilhosas de
Davi, as quais os discípulos ainda não sabiam. Depois lhes mandou que
fossem à região de Sicar, para aí dar testemunho da
ressurreição”.
Jesus
aparece novamente e converte o Apóstolo S. Tomé da descrença
Durante a viagem a Sicar, procurou
Tomé os Apóstolos, que lhe contaram a aparição do Salvador ressuscitado. Ele,
porém, não quis acreditar, antes de Lhe ter tocado nas chagas. Mesmo quando
Pedro falou publicamente, na escola de Thaenath-Silo, sobre a ressurreição de
Jesus e a seu convite, mais de cem das pessoas presentes levantaram a mão, como
testemunhas, pois tinham visto Jesus ressuscitado. Tomé ainda não chegou a crer
firmemente.
Os apóstolos e discípulos
tornaram a celebrar o sábado na sala do Cenáculo, em Jerusalém. Terminando o
sábado, fizeram um grande ágape e reuniram-se depois para a oração. Tomé estava
também presente nessa ocasião. Depois que a SS. Virgem e Madalena entraram,
fecharam-se as portas. Os Apóstolos oraram
primeiro, ajoelhados diante do Santíssimo e cantaram salmos, em coros
alternados, depois começaram a conversar.
“Mas a pouco depois,
narra a piedosa freira, se lhes tornaram os rostos maravilhosamente felizes e
comovidos, pela aproximação do Senhor. Vi Jesus no pátio, resplandecente e
vestido de branquíssima veste e cinta. Dirigiu-se à porta do vestíbulo, a qual
se abriu diante d'Ele e fechou-se-Lhe após. Os discípulos, que estavam no
vestíbulo, viram a porta abrir-se e retiraram-se para o lado,para dar caminho. O
Senhor atravessou depressa o vestíbulo e entrando na sala, passou entre Pedro e
João, que, como todos os Apóstolos, também se afastaram para o lado, enquanto o
Senhor ficava no lugar de Pedro. Nesse instante parecia a sala vasta e clara,
pois vi o Senhor rodeado de luz. Os Apóstolos retiraram-se apenas desse círculo
de luz; parecia-me que do contrário não o teriam visto.
Jesus disse primeiro: “A
paz seja convosco”. Depois conversou algum tempo com Pedro e João e colocou-se
sob o candeeiro, acercando-se um pouco mais da roda.
Vi que Tomé, ao ver
Jesus, ficou muito comovido, recuando a timidamente um pouco. Jesus, porém,
tomou com a mão direita a mão direita de Tomé e segurando-a pelo dedo indicador,
colocou a ponta desse dedo na chaga da mão esquerda. Depois tomou com a esquerda
a outra mão de Tomé e pôs-lhe os dedos na chaga da mão direita; levou a mão
direita de Tomé ao peito, sob a roupa, sem descobrir o peito, pondo-lhe o
indicador e o médio na chaga do lado. Disse então algumas palavras, que não me
recordo mais. Tomé, porém, exclamou: “Meu Senhor e meu Deus!” e
caiu desmaiado por terra, enquanto Jesus ainda o segurava pela mão. Os que
estavam perto, socorreram-no e Jesus levantou-o pela mão.
A princípio não vi as
chagas de Jesus, mas quando tomou a mão de Tomé; vi-as, não como chagas
sangrentas, mas como pequenos sóis ofuscantes. Os outros discípulos ficaram
muito comovidos por esta cena e estendiam as cabeças para a frente, porém, sem
avançar muito, para ver o que o Senhor fazia Tomé apalpar. Só Maria viu, durante
toda a presença do Senhor, sem movimento exterior, em profunda e silenciosa
adoração interior; estava como extasiada. Madalena parecia um pouco mais
comovida, mas não tanto exteriormente como os discípulos.
Jesus não desapareceu
imediatamente; conversou ainda um pouco e pediu também algo de comer. Vi que lhe
trouxeram novamente um prato, que continha algo de semelhante a peixe, de que
comeu, benzendo-o, dando um bocado primeiro a Tomé e depois o resto a alguns
outros.
Depois da conversão de
Tomé, explicou Jesus ainda porque estava no meio deles, apesar de o terem
abandonado e porque não ficava ao lado de alguns que lhe tinham permanecido mais
fiéis. Recordou-lhes também que tinha dito a Pedro que confortasse os irmãos e o
motivo por que lhe dissera. Dirigindo-se a todos, disse-lhes porque quis
dar-lhes Pedro como chefe, embora este o tivesse negado, pois o rebanho
precisa de um pastor. Falou também do zelo de Pedro.
Vi que João entrou no
Santuário e ao voltar, trouxe sobre o braço um manto largo, bordado a várias
cores e na mão um bordão alto, fino e oco, que em cima era curvo como um cajado
de pastor. Pedro ajoelhou-se diante de Jesus, que lhe deu um bocado a
comer, como um pequeno bolo luminoso, como qual Pedro recebeu um poder
particular. Jesus aproximou também a boca da boca e depois dos ouvidos de Pedro
e infundiu-lhes uma força ou um poder. Vi, porém, que não era ainda o Espírito
Santo, mas algo que o Espírito Santo, no dia de Pentecostes, devia vivificar
plenamente. Impôs-lhes também as mãos e deu-lhe poder e jurisdição sobre os
outros. Depois o vestiu com o manto que João, ao lado de Pedro, tinha sobre o
braço e pôs-lhe o báculo na mão. Disse-lhe também que esse manto era como para
guardar e recolher nele toda a força e todo o poder que lhe tinha dado,
indiacando-lhe também que devia usar esse manto sempre que quisesse fazer uso do
seu poder.
Jesus falou também de um
grande batismo, depois da vinda do Espírito Santo; disse que Pedro desse o poder
que recebera, também aos outros, após oito dias. Ordenou ainda que alguns
depusessem a veste branca e vestissem a outra, com um peitoral; outros no
entanto deviam vestir as vestes brancas. Era a instituição de graus elevados da
hierarquia e das ordens, em que deviam entrar.
Depois se agruparam os
discípulos, por ordem de Jesus, em sete grupos separados, dos quais cada um
recebeu como chefe um Apóstolo. Tiago o Menor e Tomé ficaram ao lado de Pedro.
Foi por ordem de Jesus que se agruparam. Pareciam representar sete comunidades
ou sete Igrejas; o que representavam os três Apóstolos restantes não sei
bem.
Pedro, com o novo poder
e dignidade, fez uma alocução a todos; parecia um novo homem, cheio de energia.
Escutaram-lhe palavras, chorando e com grande emoção; consolou-os o Apóstolo e
falou de muitas coisas, que Jesus sempre predissera e que agora se tinham
realizado. Lembrou-lhes também que Jesus sofrera por dezoito horas o
escárnio e a ignomínia do mundo inteiro.
Durante o discurso de
Pedro desapareceu Jesus. Nenhum susto nem admiração interrompeu a atenção
prestada ao discurso de Pedro, que parecia dotado de nova força. Depois cantaram
um salmo em ação de graças. Jesus não falara nem com a Virgem Santíssima, nem
com Madalena.
A pesca
milagrosa. Jesus proclama Pedro supremo Pastor
Quando o Senhor apareceu na sala do Cenáculo, deu também ordem a Pedro de ir, com os Apóstolos, a Tibérias pescar. Encaminharam-se, portanto, em vários grupos e por caminhos diversos, para o mar da Galiléia. Entraram numa casa de pesca fora de Tibérias, a qual Pedro antigamente tivera arrendado, mas já havia três anos que não pescava mais ali. Pedro entrou, com Natanael e Tomé, numa embarcação maior e João, com Tiago, João Marcos e Silas, numa barca menor. Pedro mesmo quis remar; era extraordinariamente humilde e modesto, apesar de Jesus o haver distinguido tanto, diante de todos. Cruzaram durante toda a noite o lago, à luz de archotes, lançando muitas vezes a rede, mas retiravam-na sempre vazia. Durante esse trabalho cantavam e rezavam em voz alta.
Enquanto os apóstolos se
ocupavam desse modo com a pesca, veio o Salvador, pairando, do vale de Josafá
para o lago, acompanhado de muitas almas de Patriarcas, que livrara do Limbo e
de outras almas remidas. Na margem do lago havia um lugar, onde se costumava
fazer uma fogueira. No momento em que Jesus pensou que aí se devia prepara um
peixe, apareceu imediatamente, diante das almas dos Patriarcas, um peixe,
fogueira e tudo quanto era necessário.
“As almas dos
Patriarcas, explica a piedosa freira, tiveram parte na preparação do peixe e no
próprio peixe, que significava a Igreja padecente: as almas do purgatório. Por
essa refeição foram unidas exteriormente com a Igreja. Jesus deu aos Apóstolos,
com essa refeição de peixe, a compreensão nítida da Igreja padecente e
militante. Jonas no ventre do peixe simboliza também a estadia de Jesus nos
Infernos”.
Já estava amanhecendo,
quando os apóstolos, fatigados pelo trabalho, queriam lançar âncora perto da
praia. Estavam já vestindo as túnicas, quando viram a figura de um homem, atrás
do caniçal da praia.
Era Jesus, que exclamou:
“Meus filhos, não tendes alguma coisa para comer?” Responderam:
“Não”. Então disse Jesus que lançasse a rede para o lado oeste da
barca de Pedro. Assim fizeram e João tinha de dirigir o seu barco para outro
lado da embarcação de Pedro. Mas como sentissem o peso da rede cheia, João
reconheceu Jesus e gritou para Pedro, no meio do lago silencioso: “É o
Senhor”. Então vestiu Pedro imediatamente a túnica, saltou na água e
nadou em direção à praia e através do caniçal, ao encontro de Jesus. Quando já
estava com o mestre, chegou também João. Jesus disse a Pedro que trouxesse os
peixes. Puxaram portanto as redes para a praia e vi que Pedro atirou os peixes
da rede para a praia. Eram, porém, 153 peixes, de várias espécies, os
quais significavam 153 novos fiéis, que se converteram em Tebes.
Achavam-se na embarcação
diversos homens, servos do pescador de Tibérias, que ficaram com as barcas e os
peixes; os Apóstolos, porém, seguiram Jesus à cabana. Disse-lhes o Mestre que
viessem comer. Ao chegarem, vi que as almas dos Patriarcas tinham desaparecido;
os Apóstolos, porém, ficaram muito admirados, ao verem a fogueira e o peixe, que
não era dos que haviam pescado e pão e bolos cozidos de mel e farinha.
Recostaram-se ao lado de um madeiro grosso, que estava diante da cabana e servia
de mesa. Jesus deu a cada um, sobre um pão chato, uma porção de peixe da
assadeira; não vi, porém, o que o peixe diminuísse. Deu-lhes também do bolo de
mel e depois se deitou à mesa e comeu. Tudo se fez em silêncio
solene.
Tomé tinha sido o
terceiro dos que pressentiram na barca a presença de Jesus. Todos estavam
tímidos e acanhados, pois o Mestre estava mais espiritual do que em outras
ocasiões e toda a refeição e a hora tinham algo de misterioso. Ninguém se
atreveu a fazer pergunta alguma; reinava santo e solene silêncio, que causou
assombro a todos. Jesus parecia mais recolhido, não se lhe percebiam as
chagas.
Após a refeição, vi Jesus
levantar-se, como também os discípulos, dirigindo-se à praia, onde passearam; no
fim de algum tempo, parou o Divino Mestre e disse, em tom solene, a Pedro:
“Simão, filho de Jonas, amas-me mais do que estes?” Pedro respondeu timidamente:
“Sim, Senhor, sabeis que vos amo”. Jesus disse-lhe: “Apascenta meus cordeiros”.
No mesmo instante vi uma imagem da Igreja e do Bispo supremo, ensinando e
guiando os primeiros cristãos, que ainda eram fracos e vi também batizar e lavar
muitos recém-convertidos, como tenros cordeiros.
Depois continuaram
passeando, às vezes parava Jesus, virando-se para os discípulos, que por seu
lado também se volviam para Ele. Depois de algum tempo, o Mestre disse novamente
a Pedro: “Simão, filho de Jonas, amas-me?” Pedro, muito tímido e
humilde, lembrando-se de sua negação, respondeu novamente: “Sim, Senhor,
sabeis que vos amo”. E Jesus disse mais uma vez, em tom solene:
“Apascenta minhas ovelhas”. Nesse momento tive a visão da Igreja
crescente e da perseguição e vi como o supremo Bispo reunia os cristãos
dispersos, cujo número sempre aumentava, como os protegia e lhes enviava
pastores e os governava.
Depois de ter andado
novamente por algum tempo, disse Jesus, pela terceira vez: “Simão, filho
de Jonas, amas-me? Então vi Pedro contristado, pensando que Jesus
perguntava tantas vezes por duvidar de seu amor; lembrando-se de havê-lo negado
três vezes, disse: “Oh! Que amor deve ter Jesus e quanto amor carece ter um
pastor, que três vezes lhe pergunta pelo amor, àquele a quem quer entregar o
rebanho”. Jesus disse de novo: “Apascenta minhas ovelhas! Em
verdade, em verdade te digo: quando era mais moço, cingias-te a ti próprio e ias
onde querias; mas quando ficares velho, estenderás as mãos e outro te cingirá e
levar-te-á aonde não quererás ir. Segue-me”.
Virou-se Jesus então para
continuar o caminho e João foi com Ele; Jesus disse-lhe uma coisa que só ele
ouviu. Vi, porém, que Pedro, ao vê-lo, apontou para João e perguntou ao Senhor:
“Senhor, que se dará com este?” E Jesus, castigando-lhe a curiosidade,
disse-lhe: “Se quero que ele fique até que eu venha, que tens com isso?
Segue-me tu!” Virou-se, pois e continuou o caminho.
Quando Jesus disse pela
terceira vez: “Apascenta minhas ovelhas” e que haviam de cingi-lo
e conduzi-lo, tive uma visão da Igreja já muito desenvolvida, vi Pedro em Roma,
amarrado e crucificado e os tormentos dos Santos em diversos lugares.
Vi também que Pedro teve
a graça de contemplar tudo isso em espírito e conhecer o seu fim e que, olhando
para João, viu que este também seguia Jesus em vários sofrimentos; pensou no
mesmo momento: “Então este, a quem Jesus tanto ama, porventura não será também
crucificado, como ele?” Perguntou, pois, a Jesus, que por isso o
repreendeu.
Por algum tempo
acompanharam mais Jesus, que lhes disse o que haviam de fazer, desaparecendo
depois diante deles. Dirigiu-se a Gergesa, a leste do lago; os Apóstolos, porém,
voltaram a Tibérias”.
A piedosa vidente viu
depois ainda o Salvador e as almas no Paraíso, que descreve como ainda existente
e ligado à terra, porém, inacessível. Jesus visitou ainda, em companhia delas,
os campos de grandes batalhas e todas as terras onde os Apóstolos primeiro
anunciariam o Evangelho, para as abençoar com sua presença.
Jesus
revela-se a quinhentos discípulos numa montanha
De Tibérias foram os Apóstolos, por um caminho de várias horas, a um lugar onde Pedro ensinou e curou enfermos. Falou com muito entusiasmo e grande mansidão da Paixão e Ressurreição de Jesus e da pesca milagrosa. Quando os Apóstolos partiram do lugar, seguiu-os grande multidão de povo a uma montanha, da qual se podia ver todo o mar da Galiléia. Muitos discípulos e também as santas mulheres já se tinham aí reunido. A Mãe de Deus, porém, ficara em Jerusalém, percorrendo três vezes por dia a Via Sacra.
No cume do monte havia
uma escavação, em cujo centro se achava uma coluna, que servia de púlpito. Eram
cinco os caminhos que conduziam ao cume da montanha; para cada atalho mandou
Pedro um dos Apóstolos, para ensinar ao povo, que por causa da grande multidão
que afluía, não podia ouví-lo. Pedro, estando ao pé da coluna e rodeado dos
restantes Apóstolos e discípulos e de muito povo, anunciou a Paixão, a
Ressurreição e as aparições do Cristo.
“Vi, porém, narra a
piedosa freira, Jesus vindo da mesma região da qual viera Pedro. Subiu o monte e
as santas mulheres que estavam nesse caminho, prostraram-se diante dEle.
Passando-lhes perto, dirigiu-lhes algumas palavras. Quando, porém,
resplandecente e luminoso, ia passando pelo meio do povo, estremeceram
muitos com medo e todos esses não perseveraram na fé. O Senhor avançou
para o centro, até à coluna, onde antes estivera Pedro, que então se lhe colocou
em frente. Jesus falou da necessidade de abandonar tudo e de imitá-Lo e da
perseguição que teriam de sofrer. Afastaram-se, porém, cerca de duzentas
pessoas presentes, ao ouvirem essas palavras.
Depois de se terem ido
embora, disse o Senhor que tinha falado ainda benignamente, para não
escandalizar os fracos. Mas então falou muito claramente aos Apóstolos e
discípulos dos sofrimentos e das perseguições que teriam de suportar no mundo
aqueles que O seguissem e da recompensa eterna. Disse-lhes também que ficassem
em Jerusalém e que só depois de lhes ter enviado o Espírito Santo, batizassem em
nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo; antes deviam fundar uma comunidade de
fiéis. Jesus dispôs ainda como se deviam distribuir pela terra e fundar
comunidades mais longínquas; depois deviam reunir-se de novo e partir outra vez
para terras distantes, que recebiam o batismo de sangue.
Enquanto Jesus estava no
meio deles falando, ficavam as almas dos Patriarcas em roda da assembléia, mas
invisíveis para todos. Jesus, porém, desapareceu, como uma luz que se apaga e
muitos se prostraram por terra, tocando com o rosto o chão. Pedro ensinou ainda
em seguida e rezou.
Foi essa a mais
importante aparição de Jesus na Galiléia, onde ensinou e demonstrou a todos a
sua ressurreição; as outras aparições eram menos públicas”.
As relações de Maria Santíssima com os Apóstolos e com a
Igreja. Jesus aparece à sua Santíssima Mãe.
Os Apóstolos e vinte discípulos estavam novamente reunidos na sala do Cenáculo, em oração. Então falou João aos Apóstolos e Pedro aos discípulos, sobre as relações para com a Mãe do Senhor.
“Vi durante essa explicação, que me parecia basear-se numa comunicação de Jesus, a aparição da Santíssima Virgem, pairando sobre eles, vestida de um manto luminoso desdobrado, que, por assim, dizer, encerrava todos. Por cima de Maria vi o céu aberto e a Santíssima Trindade, que lhe pôs uma coroa sobre a cabeça. Tive a impressão de que Maria era a cabeça verdadeira de todos aqueles fiéis, o Templo, que os abrigava. Durante essa visão não vi mais a Santíssima Virgem fora, onde estava rezando. Creio que era uma imagem do que sucedeu à Igreja, por vontade de Deus, durante essa explicação dos Apóstolos; ou era a imagem de um êxtase de Maria, durante a pregação dos Apóstolos”.
Seguiu-se uma refeição,
na qual a Santíssima Virgem estava sentada entre Pedro e João, à mesa dos
Apóstolos. Depois rezou Maria, coberta com o véu, junto com os Apóstolos, na
sala do Cenáculo. Abriu-se também o Santíssimo, diante do qual rezaram de
joelhos.
“Meia noite já podia ter
passado, quando a Santíssima Virgem recebeu de joelhos o Santíssimo Sacramento
da mão de Pedro, que trouxe os bocados sobre o pratinho do cálice e lhe pôs na
boca o pedaço que ainda fora partido pelo próprio Jesus. Vi no mesmo momento o
Senhor aparecer a Maria e desaparecer de novo, mas invisível para os outros. A
Virgem Santíssima estava penetrada de luz e esplendor. Rezaram ainda e depois se
separaram. Os Apóstolos manifestaram durante essa cerimônia ainda mais respeito
para com Maria; outrora eram sempre familiares, embora respeitosos”.
Depois de ter recebido o
Santíssimo Sacramento, retirou-se Maria, com as outras mulheres, para a sua
morada, em casa de João Marcos, onde ainda permaneceu mais tempo em oração. Ao
amanhecer, entrou Jesus, através das portas fechadas, no quarto da Mãe
Santíssima, conversando muito tempo com ela.
“Disse-lhe que devia
ajudar os Apóstolos e tudo o que lhes devia ser. Era tudo espiritual e
misterioso. Deu-lhe, porém, poder sobre a Igreja, a força, a qualidade de
protetora e vi que a luz do Filho de Deus se derramou na Virgem Santíssima, como
se Ele mesmo a penetrasse. Não posso descrevê-lo bem. Desapareceu de novo pela
porta. Ela, porém, rezou ainda e deitou-se depois, para dormir.
Vejo a Santíssima Virgem,
desde que comungou, mais vezes com os Apóstolos; são outras agora as relações
que tem com eles; Pedem-lhe conselho, é como a Mãe de todos e até como um
Apóstolo”.
Outras
aparições de Jesus.
O número dos fiéis crescia visivelmente. Muitos, vindos de fora, eram alojados num vasto edifício em ruína, perto do Cenáculo, (o castelo de Davi); outros, mais tarde, numa casa perto da piscina de Betesda na qual ensinavam os Apóstolos. Assombrados pelos numerosos prodígios e milagres, os judeus ainda não ousavam empregar meios violentos contra a comunidade. Esforçavam-se, porém, por dissimular tudo e negar os fatos; fecharam com alvenaria a porta que ligava o monte do Templo ao bairro adjacente, de modo que a comunidade ficava isolada; mas, mesmo antes disto, nem os Apóstolos e discípulos, nem os novos aderentes iam ao Templo, pois o Santíssimo achava-se no Cenáculo.
Catharina Emmerich(*) viu
ali diversas vezes solenes reuniões, com oração e canto de salmos diante do
Santíssimo Sacramento; Jesus mesmo instruíra os Apóstolos a respeito. Numa
dessas piedosas reuniões, na qual Maria tomava parte, apareceu Jesus de repente
no meio deles, anunciando-lhes que viria no segundo dia depois do sábado
seguinte. Antes que se refizessem da surpresa, já tinha desaparecido de novo.
Quando depois os
Apóstolos foram a Betânia, Jesus caminhou de súbito diante deles, mas
desapareceu logo depois.
Uma outra vez, quando
Pedro, João, Tiago o Menor, Tomé e alguns outros Apóstolos iam, pelo meio-dia,
de Betânia a Jerusalém, perto do monte das Oliveiras, apareceu-lhes Jesus de
repente e conversou com eles. Mas depois continuaram o caminho, foi como se
ficasse atrás, assim desaparecendo.
Mais tarde esteve Jesus
mais uma vez com eles, durante um ágape no Cenáculo. Comeu só com os Apóstolos,
benzeu o pão, partiu-o e ensinou. As mulheres tomaram a refeição na ante-sala,
os discípulos nos corredores laterais.
Quanto mais se aproximava
o dia da separação e ascensão de Jesus ao céu, tanto mais vezes parece ter-se
mostrado aos discípulos. Assim narra a piedosa Emmerich:
“O Senhor andava com os
Apóstolos em muitos caminhos, na vizinhança de Jerusalém, de maneira que muitos
judeus viram as aparições. Quando, porém, aparecia, fechavam as casas e
escondiam-se. Os Apóstolos e discípulos tratavam-nO com certa timidez, pois
manifestava-se-lhes muito espiritual. Jesus ensinava muito e censurava também
algumas faltas dos Apóstolos. Durante a noite vi o Senhor aparecer e espalhar a
bênção também em outros lugares, como por exemplo, em Belém. Em Nazaré, onde
tinha muitos inimigos, apareceu a vários descrentes e principalmente à gente com
que Ele e a Virgem Santíssima tiveram antes relações. Ainda em muitos outros
lugares O vi aparecer. Os homens que O viram, tornaram-se muito crentes e
reuniram-se, no dia de Pentecostes, aos Apóstolos e discípulos.
Nos últimos dias se
mostrava Jesus continuamente e muito natural para com os Apóstolos. Comia e
rezava com eles e ensinava-lhes. Fazia com eles longos passeios, repetindo-lhes
toda a doutrina. Somente durante a noite permanecia em outros lugares, sem que
soubessem.
A estigmatização deu-se-lhe a 29 de Dezembro de 1812. Nesse dia, às 3 horas da tarde, estava deitada, com os braços estendidos, em êxtase, meditando na Sagrada Paixão de Jesus. Esse estado e a estigmatização tornaram-se públicos na cidade, em Março de 1813.
Depois de muitos e indizíveis sofrimentos, chegou o dia da sua morte - 9 de Fevereiro de 1824. A 15 de Janeiro desse ano dissera a Serva de Deus: "Na festa de Natal o Menino Jesus me trouxe muitos sofrimentos, hoje me deu ainda maiores, dizendo: "Tu me pertences, és minha esposa: sofre como eu sofri; não perguntes porque, é para a vida e para a morte".
Anna Catharina achou muitos veneradores na Alemanha e longe, além das fronteiras, que se alegraram pela abertura do processo chamado de informação, feito pela autoridade diocesana de Muenster, no ano de 1892. Encerrou-se esse processo no ano de 1899, sendo os documentos enviados à Santa Sé em Roma, para pedir a beatificação da piedosa sofredora. Sua beatificação ocorreu em 3 de outubro de 2004.
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