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quarta-feira, 10 de julho de 2013

A CASA DE AREIA




No processo crescente de intimidade com Deus, em nossa caminhada espiritual, geralmente nós nos empolgamos com a mudança radical que ocorre nas nossas vidas. Limpando-nos de todos os vícios e pecados, encontramos em nós a essência dada pelo Pai que nos faz ser amados em profundidade e abraçados pelo particular consolo de Sua Misericórdia. Na mesma medida, observamos nas pessoas de nosso convívio espiritual exemplos a serem seguidos para alcançar a graça da santidade, da confiança cega no amor de Deus. Amigos, padres, pregadores, enfim, qualquer pessoa que reflita um pouco mais de autoridade em matéria de oração deixa em nós essa espécie de anseio à mesma graça, à mesma inspiração divina. Diante delas, nós como que nos esforçamos em imitá-las e buscamos descobrir o seu segredo. Assim, inspirando-se nelas, acabamos vivenciando essa mesma devoção sem, entretanto, atingirmos maturidade e naturalidade na vivência dos dons de Deus nas nossas vidas. Sem nos deixarmos tocar, de maneira profunda, pela graça singular que Deus prepara para nós. O ponto chave a ser descoberto em tais pessoas, e que muitas vezes ignoramos em nós e em nosso esforço de auto-santificação, é o caminho de oração percorrido por elas.

Todos os pregadores que ouvimos repetem a necessidade constante de oração para o desenvolvimento do amor de Deus em nós. Não é uma exortação vazia, mas um compromisso e um requisito essencial para deixar florescer em nós a efusão dos dons carismáticos. Não há uma vida de santidade satisfatória (se é que podemos falar nestes termos) sem que haja esse diálogo e essa interação da nossa pequenez com a grandeza Daquele que é todo amor por nós. Quando crescemos na vivência da fé, é comum nos sustentarmos naquilo que Deus já fez por nós e esquecermos o prosseguimento da caminhada, que se dá pela contínua vivência da oração, sob inspiração do Espírito Santo, e que nos proporciona dar passos em direção à Graça, fazendo-nos íntimos de Cristo e da salvação que Ele traz a nós. Sem a oração, caímos na cegueira da falta de fé, perdemos o contato íntimo com Deus, que procura a ocasião da escuta para demonstrar seu Amor, pela chamado e pelo transbordamento da Sua Misericórdia.

Sem o diálogo com o Pai, a nossa caminhada se torna como que uma casa de areia fundada em bases fracas de comprometimento e responsabilidade. Sem o sustento eficaz da oração e da escuta da Palavra de Deus, toda a construção que Deus quer operar em nós para nos fortalecer diante das dificuldades e desafios se torna pó, pois não há constância no prosseguimento da fé e não há segurança no Senhor a nos motivar contra o pecado e o erro. Sem essa base a nos sustentar, facilmente caímos na tentação.

Frei Camilo Maccise, superior geral dos carmelitas descalços, nos ensina: "Não devem jamais esquecer a importância da oração cristã. Uma oração feita também no silêncio e na solidão, que ajuda os outros a encontrar momentos de deserto, zonas verdes na vida humana, para perceber qual o sentido da vida, qual o nosso papel no momento atual". É importante valorizar a oração como veículo de reflexão do momento atual de nossas vidas e do mundo à nossa volta, bem como da vontade de Deus que nos norteia e nos envolve, num eterno abraço de amor. Em nós, é instrumento de humildade e mansidão e meio de nos configurar à imagem e semelhança de Deus, fazendo-nos pequenos necessitados de Sua presença. Em muitas ocasiões, principalmente quando crescemos em estatura espiritual diante dos outros, admitimos uma postura de soberba, sem cultivarmos essa via de caridade própria da oração. Como na parábola contada por Jesus, somos como aquele fariseu que ignora o pecado do semelhante e se orgulha de manter uma conduta irrepreensível diante dos demais, aparentemente limpo das misérias do mundo. Usamos, pois, da oração como trampolim para atingirmos uma falsa perfeição e, dessa forma, ganharmos mais junto a Deus, como se este gozasse também dessa ostentação e não se refugiasse no pobre que anseia a riqueza melhor dos tesouros do céu, a paz interior, como o cobrador de impostos (cf. Lc 18, 10-13).

Ao dizer "Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador!", o publicano se revela na sua indignidade e procura a Deus como conforto e certeza de salvação. Naqueles que, verdadeiramente, vivem a lição da pobreza em Deus (e que, conseqüentemente, são vítimas da nossa imitação e "santa inveja"), Cristo opera o crescimento pela submissão, a elevação pela humilhação, e sedimenta em tais almas o alicerce da paz celeste e da confiança nos desígnios divinos. Vivendo essa condição, somos moradas eficazes a abrigar o Espírito Santo que quer nos motivar, e não construções fracas que são destruídas pela afobação e pela falta de fé. Muitos daqueles que ouvimos e seguimos como modelo de santidade e que, aparentemente, revelam-se grandes na graça que Deus lhes derrama, na verdade vivem a miséria dos necessitados do Pai, ansiosos por receber deles a mínima porção de Sua Misericórdia, pobres e humildes na oração e na espera Nele. Vivenciando essa carência, Deus nos cumula de Sua grandeza e nos preenche, justificando-nos pela força de seu ensinamento de amor.

BRENO GOMES FURTADO ALVES 



terça-feira, 9 de julho de 2013

CREIO NA REMISSÃO DOS PECADOS






Vemos aqui a misericórdia de Deus através da remissão dos nossos pecados, levando em consideração o poder dado a Igreja por Jesus para ministrar o perdão e reconciliação sobre nossas vidas.


Introdução

Quando Jesus enviou o Espírito Santo aos seus discípulos, lhes conferiu o seu próprio poder divino de perdoar os pecado: "Recebei o Espírito Santo. Aqueles a quem perdoares os pecados, lhes serão perdoados; aqueles a quem os retiveres, lhes serão retidos" (Jo. 20,22-23).


1. O pecado.

O pecado é uma falta contra a razão, a verdade. A consciência reta, uma falta ao amor verdadeiro, para com Deus e para com o próximo. O pecado, é portanto, "amor a si mesmo até ao desprezo de Deus".

Segundo S. Tómas de Aquino, com o pecado contraímos cinco males:

a. O primeiro, é a própria mancha do pecado. Quando um homem peca, mancha a sua alma, porque, como a virtude a embeleza, o pecado a enfea.

b. O segundo mal que contraímos pelo pecado é nos tornarmos objeto da aversão de Deus. (Sab. 14,9)

c. O terceiro mal é a fraqueza. O homem pecando pela primeira vez, pensa que depois pode abster-se do pecado. Acontece porém, o contrário : debilita-se pelo primeiro pecado e fica propenso para pecar mais. O pecado vai dominando cada vez mais o homem, e este, por si mesmo, coloca-se em tal estado que não pode mais se levantar. É como alguém que cai num poço. Só pode sair dele pela força divina.

d. O quarto mal é a obrigação que temos de cumprir a pena do pecado. A justiça de Deus exige que o pecado seja punido, e a pena é medida pela culpa.

e. O quinto mal contraído pelo pecado foi nos exilarmos do Reino do Céu. O homem foi afastado do paraíso por causa do pecado.

E não podemos esquecer que a Paixão de Cristo tem uma repercursão tamanha que se torna o remédio eficaz para combater todo o pecado.


2. A gravidade do Pecado (Cat. 1854)

Convém avaliar os pecados segundo a sua gravidade. A distinção entre pecado mortal e pecado venial se impôs na tradição da Igreja:

- Pecado mortal: acarreta a perda da caridade e a privação da graça santificante, isto é, do estado de graça. Se este estado não for recuperado mediante o arrependimento e o perdão de Deus, causa a exclusão do Reino de Cristo e a morte eterna no inferno, já que nossa liberdade tem o poder de fazer opções.

Este pecado requer pleno conhecimento e consentimento, caracterizando matéria grave.

- Pecado venial: enfraquece a caridade. Traduz uma afeição desordenada pelos bens criados, impede o progresso da alma no exercício das virtudes, contudo sobre a privação total da graça. É humanamente reparável com a graça de Deus.

Este pecado realizado de forma deliberado e que fica sem arrependimento dispõe-nos pouco a pouco a cometer o pecado mortal.


3. Um só Batismo para o perdão dos pecados.

Jesus ligou o perdão dos pecados à fé e ao Batismo: "Ide por tudo o mundo e proclamai o Evangelho a toda a criatura. Aquele for batizado será salvo" (Mc. 16,15 -16).

O Batismo é o primeiro sacramento do perdão, porque nos une a Cristo morto pelos nossos pecados, ressuscitado para a nossa justificação (Rm. 4,25). Quando recebemos o santo Batismo somos purificados de forma plena e completa recebemos o perdão, que apaga desde o pecado original até os pecados cometido pela nossa própria vontade. O batismo, porém, não nos livra das fraquezas que são conseqüências do pecado, mas torna-se um escudo e uma fortaleza para combatê-las.


4. O poder de ligar e desligar (Mt. 16,18)

Depois da Ressurreição, Jesus enviou os apóstolos para "anunciar as nações o arrependimento em seu Nome em vista da remissão dos pecados" (Lc. 24,47).

E quando Jesus deu a Pedro o poder de ligar e desligar as coisas do céu às coisas da terra (Mt. 16,18), Ele determinava que a Igreja ia exercer em seu Nome o sacramento da reconciliação. Deste modo, os apóstolos e seus sucessores não só anunciavam aos homens o perdão de Deus e nem só os chamava à conversão, mas comunicava-lhes a misericórdia de Deus.

E Sto. Agostinho confirma dizendo: A Igreja recebeu as chaves do Reino dos Céus para que se opere nela a remissão dos pecados pelo sangue de Cristo e pela ação do Espírito Santo. É nesta Igreja que a alma revive, ela que estava morta pelos pecados, a fim de viver com Cristo, cuja graça nos salvou.

Por isso, não há pecado algum, por mais grave que seja, que a Santa Igreja não possa perdoar. (Mt. 18,21-22).


Escola de Formação Shalom


segunda-feira, 8 de julho de 2013

A TUA PALAVRA ILUMINA OS MEUS PASSOS






A História está nas Mãos de um Deus
Onipotente, Justo, Paciente
Gênesis c.18

Mambré é um lugar santo pré-israelítico, situado a três km de Ebron a sul da Palestina. O mito da origem de Mambré foi adotado pelo clã de Abraão. O mito dizia que três figuras celestes tinham aparecido ali a uma personagem ilustre da região a quem tinham anunciado o nascimento de um filho como prêmio da hospitalidade que tinham recebido.

v. 2 Ele levantou os olhos e viu... e correu ao seu encontro... Abraão não estava adormecido mas vigilante; apercebeu-se das personagens e intuiu a sua importância. Como sempre, quando se trata das visitas do Senhor, as três personagens apareceram subitamente. Abraão não lhes pergunta quem são ou de onde vêm; é o máximo da hospitalidade típica da hospitalidade beduína.

Seja no Antigo ou no Novo Testamento, a hospitalidade é considerada um grande valor, uma virtude a praticar. ( 2 Re 4, 8-10; Tb 7,1-6; Lev 19,33-34; Mt 25,35; Rm 12,13 e 15,7; 1 Pedro 4,9).

v. 3 As personagens são três, mas Abraão dirige-se-lhes no singular. Os Padres viram nesta anomalia uma referência ao mistério trinitário: o Deus Uno e Trino.

vv. 6-8 ... acorreu... apressou-se... correu... A celeridade no acolhimento de Abraão, que não quer fazer esperar os hóspedes, é importante. O autor enfatiza-o para dizer que Abraão se comporta de maneira exemplar face aos estrangeiros. É digno do dom que lhe será concedido.

v. 10 Eis que Sara tua mulher terá um filho. É o filho da promessa, há muito esperado por Abraão.

vv. 11-12 Para evidenciar o aspecto milagroso do nascimento de Isaac, aparece sublinhada a impossibilidade física de Sara conceber, considerando a sua idade.

v. 13 Por que riu Sara? O comportamento de Sara é reprovado e evidenciada a sua falta de fé, a que ela, por medo, acrescenta uma mentira (v. 15).

v. 14 Porventura é alguma coisa impossível ao Senhor? É o ápice da narrativa. A frase virá retomada pelo arcanjo Gabriel na anunciação a Maria (Lc 1,37) e de Jesus (Mc 10,27).

Se Adonai, o Onipotente, é Deus da história, não existem obstáculos inultrapassáveis para a história da salvação, que veio, vem e virá.

v. 15 A repetição da palavra “rir” está ligada à etimologia do nome de Isaac, que deriva da mesma palavra.

vv. 17-19 É o início de uma nova péricope, inscrita num outro tempo, para sugerir que a aliança/promessa unilateral do capítulo precedente, no desígnio de Deus se torna bilateral, porque Abraão e a sua família são levados a observar a via do Senhor e a agir com justiça (v. 19). Não o fazendo, é bom que se recordem da história de Sodoma e Gomorra que vai ser contada.

Deus chamou Abraão a viver uma relação de intimidade com ele (veja-se Abraão enquanto amigo de Deus em Is 41,8 e 2Cr 20,7; Dn 3,35; Tg 2,23), por isso confia-se a ele e mostra-lhe o seu modo de ajuizar o agir humano. Este juízo normalmente permanece selado, porque intrínseco à realidade, porque está na “lógica das coisas”.

v. 21 Quero descer para ver… Os juízes, nos processos que incluem a pena capital, não podem emitir o veredicto sem terem tomado primeiro uma visão pessoal dos fatos. Neste caso específico, Deus deve ver se não há um só inocente em Sodoma.

vv. 23-33 O princípio que rege a narrativa é o de submeter ao juízo de Deus todo o povo de Sodoma e Gomorra, contando com o testemunho dos justos e a força redentora do bem. O Senhor tinha dito (v.18): nele (Abraão) serão abençoadas todas as nações da terra. Por isso, Abraão, mostrando-se solidário com o seu clã e com a humanidade, quer tentar uma operação de intercessão junto de Deus. Abraão sabe que existe uma inimizade radical entre Deus e o pecado, Deus não o aceita e quer eliminá-lo (Sl 74/75), Abraão tenta dissuadir a reta justiça de Deus. Abraão não sabe que em Sodoma não há nem um justo, o que torna impossível o irromper da graça do perdão.

v. 23 Na verdade exterminarás o justo com o ímpio? É uma clara recusa da punição coletiva, cada pessoa deve ser punida apenas como mereça (Ez 18,19-20).

v. 26 Se em Sodoma encontrar cinquenta justos… perdoarei a toda a cidade. Deus está disposto a mudar o seu veredicto em nome de um pequeno “resto” que permaneça fiel.

Em Deus existe a preponderância da vontade de salvar sobre a vontade de punir.

Um pequeno remanescente de justos, queridos por Deus, que leva avante a história da salvação, não obstante a maldade preponderante, é um tema recorrente em toda a Bíblia . Is 1,7-9 e 10, 20-23; Esd 9,6-9; Bar 2,29-35; Zc 8,10-12.

Abraão negociava com Deus, como costumavam fazer os Beduínos, tentará até dez justos. Está-se preparando assim a estrada que levará à convicção que um só justo poderá salvar a humanidade (Jr 5,1; Ez 22, 29-31). Isaías descrevê-lo-á (53,2-6) e Cristo será esse justo (Act 3,14; 22,14).

v. 27 Eu que sou pó e cinza... Abraão reconhece não ter nenhum direito de negociar com Deus.

A prece de Abraão distingue-se pela insistência, a humildade e a confiança.

Três características que o crente deve ter presentes em cada oração. Seis vezes intercede Abraão sem parar. Disto se recordará Jesus (Lc 11,5-8; 18,1-8).

Na tradição hebraica diz-se que a intercessão é como um tridente na mão do crente, que faz deslocar Deus do trono da justiça para se sentar no trono da misericórdia.


Ana Luísa Teixeira

domingo, 7 de julho de 2013

DIMENSÃO PROFÉTICA DA VOCAÇÃO






Pelo batismo somos todos profetas, reis e sacerdotes. Essa verdade, lembrada nos documentos da Igreja, tem que fazer parte de nossa vida e nossa história. E ao mesmo tempo temos que assumir com mais radicalidade e amor a nossa vocação de batizados e batizadas na Igreja. Essa verdade tem que fazer tão parte de nós que sem ela não somos os mesmos.

A vocação profética, ou a dimensão profética da vocação, deve ser vivida e vivenciada por todos os batizados e batizadas. Fugir dessa realidade é antes fugir de si mesmo, de sua verdade e de seu modo mais originário de ser pessoa, ser humano. É bonito quando nos damos conta de que, em tais situações, quase inconscientes, estamos exercendo nossa profecia.

A profecia do cristão e da cristã parte sempre do modelo mais real e originário de profeta, Jesus. Sua vida, aquilo que mais tocou os corações daqueles que primeiro foram chamados, interpelados, e sua sensibilidade para com a verdade e a justiça deve ser o fio condutor, o gerador de forças e de vida em nós. Pelo chamado Divino, que cada pessoa, na sua mais individualidade e ao mesmo tempo, na sua historicidade, devemos sempre escolher a vida.

Em face do Cristo a pessoa é chamada a realizar a sua conversão fundamental, para nele reassumir todo o seu projeto humano, numa nova dimensão de liberdade. Optar pela própria libertação pela própria realização em Cristo, é optar pelo o Reino. O jovem rico citado pelos os evangelhos sinóticos (Mt, Mc, Lc) queria a participação no Reino sem fazer todo o esforço devido; já observava os mandamentos, coisa de tanto agrado de Cristo que este olhou com especial amor; mas não queria comprometer-se e fazer a necessária opção radical. Esta é muita das vezes a postura de muitos de nós; queremos até seguir Jesus, mas não estamos dispostos a assumir a sua missão, de nos comprometermos com o Reino.

Não podemos esquecer que o Reino, pelo qual optamos, não é construção apenas de Deus, nem muito menos algo já consumado com a primeira vinda de Cristo. É uma obra de colaboração dos homens e mulheres com Deus, até o fim dos tempos. Por isso, tudo aquilo que não condiz com o Reino, ou seja, toda manifestação de ante-reino, deve ser por nós denunciado.

O próprio anúncio do Reino, que cada um é chamado a fazer, já trás em si mesmo a denúncia. Vejamos por exemplo o testemunho dos primeiros cristãos relatado nas cartas de São Paulo, como também, a história dos mártires da América - latina e do Brasil. Na história e na vida desses profetas se fez presente com toda força a ação de Deus em sua Palavra libertadora. Foi inspirados e motivados pela Palavra de Deus que os mesmo encontraram coragem para dizer não a todo projeto de morte.

A opção profética não é feita simplesmente por um capricho pessoal, ou por uma simples postura radical diante dos problemas da sociedade, do mundo. Mas, uma atitude de quem realmente entendeu o sentido ultimo da vocação e da missão. Como costumo dizer, a angústia profética não nasce dos traumas psicológicos que podemos colecionar ao longo da vida ou do trabalho pastoral.
É um carisma, que já se faz presente no âmago de nossa vocação, que o Senhor dá aos seus profetas para que, com sua presença, atitudes e palavras questionem a mediocridade da nossa vida. O profeta não é por sua vontade ou escolha simplesmente e sim porque é chamado e, ás vezes, quase violentado por Deus a aceitar a sua missão.

Não podemos esquecer a exortação feita na Carta aos Ef, 4,1... “Exorto-vos, pois, que leveis uma vida digna da vocação à qual fostes chamados...”, o que nos parece que a nossa vida deve ser tal como a própria vida do Mestre. As nossas opções deve ser as mesmas que o mestre fez. A força para colocarmos em prática essas coisas é a mesma que o Mestre recebeu, vem de Deus.

Não podemos esquecer que Deus continua chamado homens e mulheres para realizar o seu projeto de amor. Chama exatamente através dos acontecimentos da vida, através das necessidades de justiça e fraternidade, através de situações de escravidão, opressão e marginalização de tantas pessoas, através da família, da comunidade, da leitura e da meditação da Palavra, dos encontros vocacionais e de outras maneiras. Deus continua chamando, e através da resposta positiva de muitos homens e mulheres, vai realizando o seu plano de amor.

É verdade que diante do chamado Divino precisamos dá uma resposta coerente. Lembremos também que o Chamado nunca é adocicado. Ou seja, não é assim tão fácil ser fiel ao chamado que Deus dirige a nós. Ele não nos chama para ficarmos parados ou quem sabe, para vivermos uma vocação sem maiores problemas. Muitas são as dificuldades, devido também nossas carências e limitações. Mas também, muitas são as dificuldades que por assumirmos uma postura justa, somos afligidos.

O profeta é na verdade aquele homem e aquela mulher que não aceita e nem colabora com os sinais de morte. É na verdade um inconformado, e por isso, assume uma postura radical perante algumas atitudes desumanas que chegam a ameaçar e até afligir o ser humano, a beleza da criação.

O profeta é uma pessoa extremamente amável e amada. Ao contrário do que muitos afirmam, ele não é uma pessoa rude, sem graça, revoltado, ou sem alegria. Mas devido sua postura, sua radical opção e sua coragem de denunciar ele chega a incomodar algumas pessoas. Pessoas, essas, que não tem compromisso com a vida.

É próprio da missão profética do cristão incomodar. E geralmente quem incomoda, quem tem coragem de denunciar as injustiças e de fazer acontecer e aparecer à verdade, acaba sendo perseguido. O cristão tem que ter essa coragem, tem que assumir com radicalidade essa defesa a vida. Só assim estaremos de verdade dando continuidade à missão do Mestre.

Não vejo como responder uma vocação se a dimensão profética não se faz presente. É constitutiva da vocação a dimensão profética. Por isso, se ainda não assumimos com garra essa dimensão, está mais do que na hora de assumirmos. Para isso não podemos esquecer que é o Espírito de Deus que renova a nossa força. E se o nosso coração estiver fechado, se não temos olhos e ouvidos para ver e ouvir o clamor da humanidade peçamos ao Espírito que venha até nós. 

A vida se faz doação, é feliz quem descobre a missão. Por isso faz-se tão necessário o Serviço de Animação Vocacional na Igreja.


Alessandro,SDV