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(São Pedro Damião, Liber Gomorrhianus, c. XVI) |
Este vício não é absolutamente comparável a
nenhum outro, porque supera a todos em enormidade. Este vício produz, com
efeito, a morte dos corpos e a destruição das almas. Polui a carne, extingue a
luz da inteligência, expulsa o Espírito Santo do templo do coração do homem,
nele introduzindo o diabo que é o instigador da luxúria, conduz ao erro, subtrai
totalmente a verdade da alma enganada, prepara armadilhas para os que nele
incorrem, obstrui o poço para que daí não saiam os que nele caem, abre-lhes o
inferno, fecha-lhes a porta do Céu, torna herdeiro da infernal Babilônia aquele
que era cidadão da celeste Jerusalém, transformando-o de estrela do céu em palha
para o fogo eterno, arranca o membro da Igreja e o lança no voraz incêndio da
geena ardente.
Tal vício busca destruir as muralhas da pátria
celeste e tornar redivivos os muros da Sodoma calcinada. Ele, com efeito, viola
a temperança, mata a pureza, jugula a castidade, trucida a virgindade, que é
irrecuperável, com a espada da mais infame união. Tudo infecta, tudo macula,
tudo polui, e tanto quanto está em si, nada deixa puro, nada alheio à imundície,
nada limpo. Para os puros, como diz o Apóstolo, todas as coisas são puras; para
os impuros e infiéis, nada é puro, mas estão contaminados o seu espírito e a sua
consciência (Tit. I, 15).
Esse vício expulsa do coro da assembléia
eclesiástica e obriga a unir-se com os energúmenos e com os que trabalham com o
diabo, separa a alma de Deus para ligá-la aos demônios. Essa pestilentíssima
rainha dos sodomitas torna os que obedecem as leis de sua tirania torpes aos
homens e odiáveis a Deus, impõe nefanda guerra contra Deus e obriga a alistar-se
na milícia do espírito perverso, separa do consórcio dos Anjos e, privando-a de
sua nobreza, impinge à alma infeliz o jugo do seu próprio domínio. Despoja seus
sequazes das armas das virtudes e os expõe, para que sejam transpassados, aos
dardos de todos os vícios. Humilha na Igreja, condena no fórum, conspurca
secretamente, desonra em público, rói a consciência como um verme, queima a
carne como o fogo.
Arde a mísera carne com o furor da luxúria,
treme a fria inteligência com o rancor da suspeita, e no peito do homem infeliz
agita-se um caos como que infernal, sendo ele atormentado por tantos aguilhões
da consciência quanto é torturado pelos suplícios das penas. Sim, tão logo a
venenosíssima serpente tiver cravado os dentes na alma infeliz, imediatamente
fica ela privada de sentidos, desprovida de memória, embota-se o gume de sua
inteligência, esquece-se de Deus e até mesmo de si.
Com efeito, essa peste destrói os fundamentos
da fé, desfibra as forças da esperança, dissipa os vínculos da caridade,
aniquila a justiça, solapa a fortaleza, elimina a esperança, embota o gume da
prudência.
E que mais direi, uma vez que ela expulsa do
templo do coração humano toda a força das virtudes e aí introduz, como que
arrancando as trancas das portas, toda a barbárie dos vícios?
Com efeito, aquele a quem essa atrocíssima
besta tenha engolido, entre suas fauces cruentas, impede-lhe, com o peso de suas
correntes, a prática de todas as boas obras, precipitando-a em todos os
despenhadeiros de sua péssima maldade. Assim, tão logo alguém tenha caído nesse
abismo de extrema perdição, torna-se um desterrado da pátria celeste, separa-se
do Corpo de Cristo, é confundido pela autoridade de toda a Igreja, condenado
pelo juízo de todos os Santos Padres, desprezado entre os homens na terra,
reprovado pela sociedade dos cidadãos do Céu, cria para si uma terra de ferro e
um céu de bronze. De um lado, não consegue levantar-se, agravado que está pelo
peso do seu crime; de outro, não consegue mais ocultar seu mal no esconderijo da
ignorância, não pode ser feliz enquanto vive, nem ter esperança quando morre,
porque, agora, é obrigado a sofrer o opróbrio da derrisão dos homens e, depois,
o tormento da condenação eterna.
São Pedro Damião, bispo e doutor da Santa Igreja
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